Como a
fotografia é muito mais um documento impregnado de fantasia, tanto do fotógrafo
quanto do fotografado, quanto do “leitor” da fotografia, do que de exatidões
próprias da verossimilhança. O que o fotógrafo registra em sua imagem não é só
o que está presente ali no que fotografa, mas também, e, sobretudo, as
discrepâncias entre o que pensa ver e o que está lá, mas não é visível. A
fotografia é muito mais indício do irreal do que do que do real, muito mais o
supostamente real recoberto e decodificado pelo fantasioso, pelos produtos do
autoengano necessário e próprio da reprodução das relações sociais e de seu
respectivo imaginário. A fotografia, no que supostamente revela e no seu
caráter indicial, revela também o ausente, dá-lhe visibilidade, propõe-se antes
de tudo como realismo da incerteza. (MARTINS, 2008, p.28)
O
fotógrafo é capaz de converter uma rua da cidade, um momento, o olhar de uma
criança, de um velho, a solidão dum homem em mitos, em concepções imagéticas
que transportam o espectador para novas, e por vezes velhas dimensões. A fotografia contemporânea, tal como a
pintura, tem na sua essência a criação de metáforas, de conotações, de
analogias diversas, conseguindo converter a objetividade em subjetividade. O
visível não é necessariamente aquilo que se nos é apresentado perante os olhos.
(TAVARES, 2008)
Durante
todo meu percurso, busquei em cada imagem obtida abstrair o cotidiano, compor
imagens que dessem vazão à conotação, a interpretações diversas a cada leitura.
Entretanto, busquei na série “Abstraindo o Cotidiano” modos muito mais
sugestivos e cheios de significações para registrar minha cidade. Na imagem abaixo busquei captar algo que sempre aprecio observar nos dias de chuva , a distorção
natural que as gotas de chuva provocam nas janelas em meus percursos
cotidianos. Dias chuvosos são melancólicos a meu ver, pois gosto das cores
encontradas nos dias ensolarados, mas são precisos e necessários em nossas
vidas.
Na
área das emoções a fotografia tenta nestes tempos, como, aliás, já o fez no
passado, de acordo com Tavares (2009), explorar e tratar a condição humana:
desilusão, ansiedade, desespero, solidão, fobia, mas também a alegria, a festa,
a esperança. “O ser humano, na sua relação com o mundo atual, é o centro de
atenção dos artistas mais recentes”. (TAVARES, 2009, p.8)
Praia
do Sonho vista da janela num dia chuvoso. Foto de Thais
Oliveira Silva. 30. Abr. 2012.
Para tanto, é necessário ter em
mente que:
A
fotografia não está enclausurada à condição de registro iconográfico dos
cenários, personagens e fatos das mais diversas naturezas que configuram os
infinitos assuntos a circundar os fotógrafos, onde quer que se movimentem. A
fotografia por ser meio de expressão individual, sempre se prestou a incursões
puramente estéticas; a imaginação criadora é pois inerente a essa forma de
expressão; não pode ser entendida apenas como registro da realidade factual. A deformação intencional [grifo nosso] dos
assuntos através das possibilidades de efeitos ópticos e químicos, assim como a
abstração, montagem e alteração visual da ordem natural das coisas, a criação
enfim de novas realidades têm sido exploradas constantemente pelos fotógrafos.
Nesse sentido, o assunto teatralmente construído segundo uma proposta
dramática, psicológica, surrealista, romântica, política, caricaturesca etc.,
embora fruto do imaginário do autor, não deixa de ser um visível fotográfico
captado de um realidade imaginada. Seu respectivo registro visual documenta a
atividade criativa do autor, além de ser, em si mesmo, uma manifestação de
arte. (KOSSOY, 2001, p. 49)
Novamente,
Kossoy (2001, p. 50) declara a atuação do fotógrafo como filtro cultural: “seu
talento e intelecto influirão no produto final desde o momento da seleção do
fragmento até sua materialização iconográfica.” Deste modo o testemunho e a
criação são indissociáveis, nas palavras do autor, são um “binômio indivisível”.
Não importa o assunto registrado na fotografia, esta não será nunca imparcial,
documentando sempre a visão de mundo do fotógrafo. Ela é um duplo testemunho
por: “nos mostrar a cena passada, irresistível, ali congelada
fragmentariamente, e por aquilo que nos informa acerca de seu autor” (KOSSOY,
2001, p. 50) O autor prossegue afirmando sobre o poder do fotógrafo na
concepção da imagem:
As
possibilidades de o fotógrafo interferir na imagem – e portanto na configuração
própria do assunto no contexto da realidade – sempre existiram desde a invenção
da fotografia. Dramatizando ou valorizando esteticamente os cenários,
deformando a aparência dos seus retratados, alterando o realismo físico da
natureza e das coisas, omitindo ou introduzindo detalhes, elaborando a
composição ou incursionando na própria linguagem do meio, o fotógrafo sempre
manipulou seus temas de alguma forma: técnica, estética ou ideologicamente.
(KOSSOY, 2001, p.108)
Porém,
é difícil quebrar alguns paradigmas na área da fotografia, pois o valor da
mesma como o espelho do real está cristalizado no senso comum. Sontag (2006)
nos lembra de que:
O
que está escrito sobre uma pessoa ou um fato é, declaradamente, uma
interpretação, do mesmo modo que as manifestações visuais feitas a mão, como
pinturas e desenhos. Imagens fotográficas não parecem manifestações a respeito
do mundo, mas sim pedaços dele, miniaturas da realidade que qualquer um pode
fazer ou adquirir. [...] Porém, apesar da presunção de veracidade que confere
autoridade, interesse e sedução a todas as fotos, a obra que os fotógrafos
produzem não constitui uma exceção genérica ao comércio nebuloso entre arte e
verdade. Mesmo quando os fotógrafos estão muito mais preocupados em espelhar a
realidade, ainda são assediados por imperativos de gosto e de consciência.
(SONTAG, 2006, p.16-17)
Tal fato
nós podemos observar em nosso cotidiano ao nos depararmos com as imagens
publicitárias, as quais após sua edição tem o enorme poder de seduzir a
população em geral. Para Sontag (2006), a imaginação fotográfica envolve um
modo de produção de imagens fotográficas, a composição e a perspectiva, o apelo
a recursos técnicos para escolher e definir a profundidade de campo, enfim, um
modo de construir a fotografia, de juntar no espaço fotográfico tudo o que da
fotografia deve fazer parte e o modo como deve fazer parte.
O chamado “congelamento” do instante
fotográfico é na verdade a redução das desencontradas temporalidades contidas
nos diferentes componentes da composição fotográfica a um único e peculiar
tempo, o tempo da fotografia. [...] Se a fotografia aparentemente “congela” um
momento, sociologicamente, de fato, “descongela” esse momento ao remetê-lo para
a dimensão da história, da cultura e das relações sociais. O “congelar” não é
mais do que o sublinhar elementos de referência de um imaginário cujo âmbito
não se restringe ao reducionismo dos supostos “congelamentos”. (SONTAG, 2006,
p. 65)
Portando,
nestes congelamentos obtidos com nossas imagens fotográficas pomos em evidência
tudo aquilo que denuncia o que apreciamos, quais são nossas referências
estéticas, revelando-nos a todo o momento. Neste sentido, revelando a condição
em que se encontra o fotógrafo:
O
fotógrafo é, pois uma categoria de observador que se pode realizar imediata e
inteiramente, no vazio verbal, mas não no vazio visual. [...] Ele fotografa o
que vê, muitas vezes sem compreender, mas sem por isso se sentir frustrado por
uma compreensão intelectual que, aliás, não busca em estado, em primeira
instância. (MARESCA
apud ANDRADE 2002, p. 142)
Este
sentimento de colecionar intensamente imagens passou a dominar-me desde
Dezembro de 2011. Cada particularidade de minha terra que eu observava e
conseguia visualizar uma boa composição, eu a registrava com minha câmera
fotográfica que me servia como um bloco de anotações.
Deste
modo, busquei constantemente observar minha cidade de modo mais apurado,
persistente, buscando ver o que dantes eu não percebia. Para descrever tal
acontecimento, faço das palavras da autora as minhas:
o
exercício de fotografar ensinou-me a contemplar as coisas do mundo, a reparar
no movimento da natureza e na natureza dos movimentos. Aprendi a observar as
pequenas coisas dentro de um universo, os detalhes dentro da globalidade. (ANDRADE,
2008, p.18)
As
palavras de Andrade (2002) esclarecem minha proposta em fomentar a observação
acurada do que nos cerca, quando nos fala que sobre a população em geral onde aprendemos a ver apenas o que precisamos ver.
Atravessamos nossos dias com viseiras, observando apenas uma fração do que nos
rodeia. Para Andrade (2002, p. 54), “Os homens modernos não são tão bons
observadores, e o uso da câmera fotográfica pode auxiliar sua percepção”.
Ainda
sobre este mesma abordagem, Andrade (2002), diz:
Olhar
para o mundo é uma condição, compreendê-lo por meio deste olhar é uma busca
eterna, instigante e fascinante. Fascinante porque é pela contemplação da
beleza do mundo que nos encantamos e nos apaixonamos. Instigante porque a
vontade de mergulhar em seu desconhecido pode nos levar ao diferente e
transformar o que estamos viciados a enxergar. (p.114)
Com
a observação atenta, fazemos parte do mundo e não apenas estamos inseridos
nele. Quanto mais nos aprofundarmos naquilo que enxergamos, mas conheceremos do
objeto e de nós mesmos. “Tecemos nossas conclusões pelos fragmentos e pelos
recortes. Tecemos um olhar por fotografias”. (ANDRADE, 2002, p.115)
Nesta
conturbada vida em que levamos, perdemos a relação com o tempo e seu
direcionamento. Observar, contemplar o nosso meio requer tempo. “Para
saboreá-las, é preciso parar, o que é quase impossível diante do imediatismo de
nossas necessidades diárias. Vida moderna, fugaz e efêmera.” (ANDRADE, 2002,
p.116)
Portanto
devemos nos debruçar atentamente sobre nosso tema, registrando-o com respeito,
saboreando o instante vivido:
“Uma
grande foto” tem de ser uma expressão plena daquilo que a pessoa sente a
respeito do que é fotografado, no sentido mais profundo, e é portanto uma
expressão verdadeira daquilo que a pessoa sente a respeito da vida em seu todo.
( ADAMS apud SONTAG, 2006, p. 135)
No ano de 1904, os irmãos Lumière, com base
numa técnica própria, começaram a fazer as primeiras fotografias coloridas,
claramente influenciadas pela pintura impressionista, indício de quanto ainda
persistia a dúvida dos fotógrafos em relação à fotografia “prisioneira da
ideologia do verossímil e quanto titubeavam em abandonar a possibilidade de
situá-la no imaginário da arte”. (MARTINS, 2008, p. 151)
O
impressionismo muito me influenciou no que concerne a fotografar várias vezes o
mesmo lugar, porém variando a perspectiva e principalmente variando em função
do dia e da luz. “Cada momento do dia criava o seu próprio espaço e, sobretudo,
a sua espacialidade singular, através da linguagem do reflexo. [...] Em
diferentes dias e em diferentes momentos do dia eram diferentes as imagens da
mesma coisa.” (MARTINS, 2008, p.158)
Penso
que há no impressionismo um ímpeto totalizador na tensão da linguagem que lhe é
própria, traços e cores libertos dos formalismos da pintura que precedeu, uma
luz que procura se expandir, incontida nos limites do quadro e do
enquadramento. A fotografia, como a pintura anterior ao Impressionismo, se
orientará no sentido de sugerir a quem a vê que o todo já está nela contido,
que não há nenhuma continuidade visual além do que foi fotografado. Em
contraste, portanto, com as primeiras holografias, de imprecisões polissêmicas
e impressionistas, sugerindo que o objeto é apenas o indício de uma visualidade
mais extensa, carregada de incógnitas mais do que seguras certezas. (MARTINS,
2008, p. 152)
Tanto nessas primeiras fotografias quanto na
pintura Impressionista, percebemos a imprecisão de contornos e a intensidade de
luz que parecem atender às necessidades de uma época de explosão do imaginário
e do anseio de liberdade de representar livremente o apresentado, anseio de
antepor a liberdade interior do sujeito à tirania exterior do objeto. Neste
conturbado século XIX encontramos: “Contradição e resistência anárquica aos
crescentes constrangimentos do imaginário contrário, o das precisões de um
objetivismo insaciável e castrador”. (MARTINS, 2008, p. 152)
Infelizmente,
desde suas origens a fotografia foi capturada para tornar-se servil do real,
sendo apenas seu espelho. Tanto que em apenas meio século de sua invenção,
conforme expõe Martins (2008), o retrato fotográfico era utilizado para
identificação nas fichas policiais e nos passaportes. Há, nesse sentido, uma
necessidade de vigilância, de deixar em cada fotografia os elementos bem
visíveis e apresentáveis.
Assim
como foi o contexto social para o surgimento do Impressionismo, que em meio a
cenários cinzentos e esfumaçados, das recentes fábricas, os artistas ansiavam
por liberdade, como nos informa Martins (2008), desejando representar
livremente, buscando principalmente a liberdade interior, para que esta se
extravase para o exterior sem nenhuma amarra e flua para sua criação artística.
E hoje, é o que desejei e busquei com esta série fotográfica. Meu contexto
social é bem diverso do momento histórico onde nasceu o Impressionismo, mas,
com o mesmo anseio destes percussores libertos, anseio pela liberdade, bem como
anseio por deixar fluir meu imaginário para cada uma de minhas fotografias. Sem
temer aos presentes e futuros constrangimentos do imaginário contrário, com
suas regras definidas e inalteráveis; cegos devido a seu objetivismo insaciável
e castrador (MARTINS, 2008), os quais tentam com suas críticas destrutivas, me
“corrigir”, mas quem há de impedir o meu olhar?
“A fotografia se afastou progressivamente do
imaginário de imprecisões reais em que nasceu sem dele se divorciar
completamente.” (MARTINS, 2008, p.159) Sua nitidez fez com que a sociedade
industrial e moderna a aprisionasse. Numa época em que a pintura explorava, com
o Impressionismo, a linguagem imprecisa da imagem, oriundas da poluição da água
e do ar, pelos reflexos gerados pela mesma, a fotografia estava fazendo o
trajeto oposto. A fotografia estava criando seu próprio mito, de acordo com o
autor, buscando o rebuscamento da forma e da semelhança com o real. Enquanto a
pintura optou pela liberdade, a fotografia escolhe sua submissão ao
supostamente documental.
Neste pressuposto, conforme analisa Martins
(2008), não é de se admirar que um pintor, Henri Cartier-Bresson, na condição
de fotógrafo, tenha criado uma linguagem e uma estética libertadora, que é uma
saída desta prisão em que a fotografia foi encerrada. Bresson através do
momento decisivo encontra a espontaneidade e liberdade ao estar previamente no
“lugar certo”, assim, o fotógrafo deve ser ágil e perspicaz. “É que para
Cartier-Bresson, coisas e pessoas se definem na relação e no relativo. A
escolha prévia do cenário do momento decisivo da fotografia é escolha da
mediação significante sem a qual o tema, a ação, não terá sentido.” (MARTINS,
2008, p.160)
Seguindo
o grande mestre Bresson, pude voltar a diversos cenários onde se desenrolaram
inúmeros fatos de minha vida e os captar de um modo único, incomum, como é o
caso da foto abaixo. Onde pude unir lembranças de minha infância às reflexões
artísticas. De minha infância tenho esta posição, que para captura-la tive que
me abaixar, mas quando eu tinha sete anos era este meu tamanho, minha visão. Eu
observava o rio sempre através destas janelas, enfim, as grades de proteção da
ponte da rodovia Padre Manoel da Nóbrega, quando íamos a pé à casa dos parentes
de minha avó.
Uma janela sob o Rio.
Foto de Thais Oliveira Silva. 05. Jul. 2012.
Este
conjunto ponte-e-rio sempre esteve guardado em minha mente. E, agora, anos
depois de tantas vivências adicionadas a esta, decidi registrá-la também
direcionando a imagem não apenas ao passado, mas ao presente, às minhas
reflexões a respeito da fotografia.
Propus
esta imagem como se estivéssemos posicionados do mundo abstrato, subjetivo
observando o mundo real, objetivo. O contraste de cores quentes, do muro e
frias, do rio também não foi aleatório, desejei que nos dessem este sensação de
oposições de mundos diferentes, mas, que ao mesmo tempo há harmonia. É a
liberdade de observar lugares conhecidos ou não com um olhar mais observador,
um olhar que é capaz de unir e imprimir nossas vivências em cada imagem
produzida.
E
esta mesma liberdade orientou a concepção de minha série fotográfica, em que na
perspectiva do fotógrafo português João Evangelista o qual suas produções
concentram-se em imagens abstratas, o qual eu contatei através inicialmente do
site olhares e mais tarde através de e-mails, fala a respeito de minha
produção:
[...] No seu caso além da leitura subjectiva ou abstracta ser mais
complexa ela só está ao alcance do observador se ele se demorar a olhar suas
fotos, no seu caso o observador é obrigado a olhar como deve ser pois ele só
será "recompensado" com uma leitura mais subjectiva do mundo real se
ele fizer um esforço e isso para mim é bom pois além do observador apurar sua
capacidade de observar fotos, você obriga-o a por em questão a realidade e o
mundo que o rodeia...É bom porque as pessoas estão tão acostumadas e ver o
mundo "direitinho" que acabam por se conformarem com tudo e aceitam
tudo sem pensar...Com essa coisa da vida cada vez mais apressada e estressada
já não põem nada em questão e aceitam tudo sem pensar duas vezes primeiro!!!
Você está fazendo com que as pessoas voltem a pensar sobre o mundo que
está à sua volta em vez de aceitar tudo sem mais nem menos!
O que você faz é distorcer o objectivo e a
realidade para que as pessoas não possam ter uma leitura óbvia e normal do
mundo real, obrigando-as a se questionarem e buscar uma leitura que torne
lógico e aceitável, acabando por se "refugiarem" numa leitura
abstracta e subjectiva em que uma casa inclinada já não incomoda, pois passou a
ser uma forma independente do que é na realidade e passa a ser aceitável estar
"torta"!!!...Tudo deixa de ser uma paisagem e passa a ser uma
harmonia de forma e linhas que dependendo da sua força visual dão uma imagem
estável ou dinâmica! [...] Quando você inclina o assunto nas suas fotos, é como
se você estivesse dando um 1º passo para que você e o observador se livre do
conformismo e rotina da realidade para depois seguir em direcção à
abstracção!...E ajudando as pessoas a "acordarem" e verem o mundo com
outro olhar!
Pelo que eu aprendi sobre abstracção, tudo pode se
tornar numa foto ou obra abstracta por uma simples razão: A verdadeira
abstracção tem sempre origem na realidade!!!!...a própria palavra está dizendo
que estamos a abstrair alguma coisa e no caso da abstracção é a
realidade!!!!...Tanto é verdade que só quando a obra final não tem nada que
seja relacionado com o mundo real é que pode ser chamada de abstracta!...Só ao
abstrair a realidade é que entramos no mundo das formas, linhas, manchas de cor
para criar harmonia sem estarmos presos ao que é familiar e real!
(PEREIRA, João Evangelista Dos Santos. JEvangelista. [mensagem pessoal]
Mensagem recebida por < jespcl3@yahoo.fr> em 03. Jul. 2012.)
Uma Face? Foto
de Thais Oliveira Silva. 06. Dez. 2012
Neste
sentido de busca por formas que nos convidem à reflexão andei por toda a cidade
tentando encontrá-las pra enfim registrar. Na imagem acima vê-se uma forma que
contém luz e sombra. A primeiro olhar eu reconheci uma face em perfil. O leitor
é livre para ler o que quiser nesta e em qualquer imagem. O importante é ler, é
perceber o mundo que nos rodeia. Tal forma foi realizada pelos reflexos da
iluminação artificial na Praia dos Sonhos numa quente noite de verão a qual
saímos para caminhar sobre ela. Tudo pode ser lido.
A
foto abaixo é algo que pertence a meu cotidiano. Sempre o vejo em meus percursos
quando vou ao centro utilizando a ciclovia da Rodovia Padre Manoel da Nóbrega.
Diversos postes de eletricidade que desde minha infância os relaciono com a
Torre Eiffel estão dispostos à beira da Rodovia. Registrei a imagem quando um
dos postes está postado em frente a enorme floresta retorcida, o grande
manguezal que se encontra após o Rio Itanhaém em direção ao sul. Focalizei
apenas parte da estrutura a fim de criar uma espécie de prisão, grades à mata
nativa. Felizmente o que lá prevalece é a Mata Atlântica.
Natureza Encarcerada. Foto
de Thais Oliveira Silva. 03. Jul. 2012
Estudei o Ensino Fundamental I e II
na Escola Estadual Prof. José Carlos Braga de Souza, localizada no Bairro do
Jardim Savoy. Há mais de vinte anos os muros da escola permanecem nesta
condição, deteriorado e com diversas fendas. Ao passar por lá, na entrada ou
saída da escola, minha distração era enquadrar a paisagem subsequente. (FIGURA
164). Os Morros do Bairro do Vergara, toda mata que circunda meu antigo bairro
estavam sob minha vista. Gostava de perceber que a cada passo, em uma nova
perfuração no muro, o enquadramento modificava, elementos novos surgiam, o
quadro era maior ou menor, dependendo do tamanho da falha do muro. E assim,
mesmo através de algo fútil, muitas vezes inaceitável, por se tratar de um muro
de uma escola, em estado de abandono, treinei meu olhar desde pequena. Meu
visor era qualquer elemento que pudesse enquadrar o mundo.
Primeiramente minha Itanhaém, a qual me
possibilitou o treino do olhar, o prazer pelo efêmero, fugaz, a observação de
acontecimentos que poucos percebem. Hoje não preciso mais das perfurações do
antigo muro. Hoje sou capaz de observar o Mundo ao meu redor com mais clareza,
com mais paixão.
Espiando através do Muro. Foto
de Thais Oliveira Silva. 29. Abr. 2012