domingo, 16 de março de 2014

O PASSADO AINDA ESTÁ PRESENTE




Andar para trás para trás para trás
Dar a mão para a mãe para a avó-bisavó
Feche os olhos abra os olhos feche e abra
A porta da roda da morte e da vida
Essa é a dança ciranda do tempo
Entre na água no meio do vento
E semeie futuro em terra azul
(Roseana Murray. Receita de Viajar no Tempo. In: Receitas de Olhar, 1999)

Realizei a série fotográfica intitulada “O Passado ainda está presente” no período de Dezembro de 2011 a Maio de 2012. Desde criança tenho uma profunda admiração pelo Centro Histórico e qualquer que seja a construção ou até mesmo objetos que tenham sobrevivido centenas de anos e se achegado a nós. Acredito que estes lugares guardam um pouco dos antigos moradores e por isso é para mim gratificante poder percorrer os mesmos trilhares que os itanhaenses eternos percorreram antes de mim. Pode até ser considerada uma atitude medíocre, mas sempre que estou nos lugares históricos, fecho os olhos por instantes e imagino-me integrada a comunidade passada, trilhando nosso chão, que em sua maioria era de areia branca, ouvindo o badalar dos ora calados sinos do Convento, apreciando cada instante da vila isolada, a antiga Vila Nossa Senhora da Conceição de Itanhaen.
Optei pelo uso monocromático do sépia, editado de diversas formas, intervindo em sua tonalidade e temperatura, para compor esta série com o objetivo de enfatizar a nostalgia nelas encontradas, como se aqui o tempo não houvesse passado. O passado ainda está presente, não apenas nestas construções, mas nas muitas memórias deste povo.
 Bechelli (1997) ilustra com perfeição este fato através de seu poema, onde fala acerca desta mesma nostalgia e afeição por nossa cidade.

Itanhaém... Em teu chão se vão
muitos passos que pisam e passam
deixando espaços e marcas de uma história
onde a glória dos teus sonhos e saudades
perpetuam vozes, cantos, encantos e choro...
mortes, folias, procissões e festas em coro...
revividos no falar e rir das velhas lembranças
ditas naquela mesma janela, porta ou esquina,
fazendo selar minh´alma nas tuas tradições
e vontades dos itanhaenses eternos...
Idas e vindas de tempos e sinas
que se esvaem pelas Bandeiras em ação,
nas boas-vindas e ladainhas a contemplar
o Divino, os Reis e a padroeira Conceição...
No mergulhar em setenários e novenas
de orações, completar o meu caminhar
em tuas ruas e telhados, ora molhados
por lágrimas de um tempo de outrora,
engasgando toda hora, o querer gritar
o quanto dela gosto e nela vivo.
E sonho que lá do alto do Itaguassu
o vento da liberdade atravessará
o antigo Convento com seu sino ora calado,
qual um hino clamado, anunciando
por onde o olhar avistar: da serra do mar,
do nascer do sol, ou na luz da lua cheia,
que toda vida brotada, regada e vivida
em teu chão quadrissecular será
mais uma fonte a irrigar e alimentar
tua memória em muitos outros corações.
Itanhaém... Sempre te amarei...
Seja em bacia ou canto de pedra alegre
pelos teus recantos e encostas de um mar
a eternizar em beijos e abraços n´areia,
o emoldurar da tua velha Vila: o largo da Matriz,
o casario, o rio... E ao fundo o badalar dos sinos
ecoando, serenamente, o palpitar do meu peito
pela saudade e certeza de ver-te
para sempre marcada em meu ventre
que plenamente aceita, toca e te sente...
(Ernesto Bechelli. Itanhaém, minha saudade in Itanhaém em Prosa e Verso,1997)

            Para registrar os aspectos do passado de minha cidade, baseei-me na proposta de Possamai (2008) que nos apresenta modos de descrever itens icônicos que compõem uma imagem fotográfica de vista urbana. Para tanto, busquei registrar sempre o local da imagem fotográfica, se foi efetuada no Centro histórico ou nos Bairros tradicionais, qual a tipologia urbana apresentada, ou seja, se tratava de uma avenida, rua, esquina, parque, praça, enfim, seu limite urbano. Busquei também registrar se a imagem fotográfica foi tomada de uma vista panorâmica, se foi vista parcial, vista pontual ou vista interna. Busquei também pontuar a temporalidade das imagens, tanto no quesito diurno e noturno, quanto nas condições climáticas, pois certamente elas influenciam na apresentação final da imagem.

             Os aspectos que continham acidentes naturais também foram registrados, buscando perceber se tratava de arborização, várzea, ou morro. Como se travava de fotografias de lugares em que há uma grande circulação de pessoas durante o expediente comercial, foi necessário registrar também os elementos móveis, ou seja, os personagens que apareciam nas tomadas das vistas destes lugares, observando se tratava-se de poucos transeuntes ou de uma multidão e qual era o gênero e a faixa etária encontrada nas imagens captadas. Busquei também registrar de modo em que os nossos meios de transportes pudessem aparecer nas imagens, para enfim registrar todos os aspectos desta minha geração na cidade de Itanhaém.

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