As estrelas que de noite eu via
Todas elas lá no céu estão
Mesmo sem vê-las durante o dia
Piscam no céu com o sol gordão
Todas elas lá no céu estão
Mesmo sem vê-las durante o dia
Piscam no céu com o sol gordão
São trilhares de estrelas e eu nem sabia
Que estão lá no céu até mesmo de dia
Como pode o céu ter tanta estrela?
Como pode? Parece um mar de areia...
Que estão lá no céu até mesmo de dia
Como pode o céu ter tanta estrela?
Como pode? Parece um mar de areia...
A areia que na praia eu via
Tantos grãos estão lá no chão
Punhadinho de areia que eu pego na mão
Tantos grãos que não cabem na numeração
Tantos grãos estão lá no chão
Punhadinho de areia que eu pego na mão
Tantos grãos que não cabem na numeração
São trilhares de grãos e eu nem sabia
Que esse número aumenta de noite e de dia
Como pode uma praia ter tanta areia?
Como pode? Parece um céu de estrelas...
Que esse número aumenta de noite e de dia
Como pode uma praia ter tanta areia?
Como pode? Parece um céu de estrelas...
Tanta areia, tanta estrela
Tanta areia tanta estrela.
Tanta areia tanta estrela.
Palavra
Cantada. Trilhares. In Canções Curiosas.
Paulo Tatit e Edith Derdyk. São Paulo, Eldorado, Selo: Palavra Cantada, 1998.
Trilhares sob este chão. Foto de Thais Oliveira Silva. 29 de
Jan. 2012.
Minha
poética visual foi norteada pela infância. A minha e a de meus queridos alunos
das quintas séries A e B de 2011 da Escola Municipal Noêmia Salles Padovan,
localizada em Itanhaém, aos quais lecionei Artes ao substituir a professora titular,
a qual estava afastada por licença médica durante este ano letivo.
Com eles, pude perceber particularidades de
Itanhaém que eu já havia esquecido, pequenas, mas tão grandiosas cenas deixadas
para trás. Meus queridos alunos, os quais com minha orientação durante as aulas
dadas leram, interpretaram e criticaram diversas imagens de nossa cidade.
Imagens de ontem e de hoje. Até que chegamos à parte de produzirmos também.
Como seriam nossas imagens? Como nós vemos nossa cidade? Eles produziram
plasticamente, através de produções de desenhos com lápis de cor, caneta
hidrocor e tinta vitral. No primeiro trimestre do ano supracitado, trabalhamos
o assunto.
Meus
alunos eram responsáveis e estavam envolvidos neste estudo, trazendo sempre
dúvidas e informações sobre nossa cidade. Planejei realizar um projeto-ação com
eles no ano de 2012, que durasse um ano letivo, e este seria o meu trabalho de
conclusão de curso, mas a direção e coordenação da escola não me permitiram,
pois a professora titular retornou e escolheu lecionar para estes alunos. Porém,
a semente plantada nestas duas classes, durante o trimestre de 2011 nunca será
arrancada.
Assim
como Exupéry (2006), também penso que as crianças sabem o que procuram, pois
prestam atenção em seus caminhos, seu olhar é apurado. Não quero perder este
olhar jamais.
Foi
por eles que ousei trilhar pelo caminho inusitado da fotografia com o
enquadramento em diagonal. Não foi algo que fui precursora, certamente não
estou sendo impertinente ao utilizar o termo “inusitado”, já que o grande
percursor deste enquadramento é Alexander Rodchenko (1891 – 1956), artista
plástico, escultor, fotógrafo e designer gráfico russo, sendo um dos fundadores
do construtivismo russo e design moderno russo. Sua fotografia era socialmente
engajada, inovadora, e oposta ao retrato estético da época. Ciente da
necessidade de uma série documental de fotografia analítica, ele fotografou
frequentemente seus assuntos em ângulos ímpares, geralmente muito de acima de
ou abaixo, para chocar o espectador. Suas imagens eliminaram o detalhe
desnecessário, enfatizaram a composição diagonal dinâmica, e foram concebidas
com o posicionamento e o movimento dos objetos no espaço.
Após
Rodchenko, outros fotógrafos ousaram uma ou outra fotografia neste
enquadramento, mas não há nenhum registro que algum outro fotógrafo tenha
fotografado uma vasta série neste enquadramento. Apaixonei-me por este
enquadramento, pois sua principal característica é conferir à imagem dinamismo
e movimento, ela reflete a mim mesma. Não é estática, nem formal. Tem energia,
conduz o olhar dum canto a outro da imagem.
Senti-me forte e segura ao poder estar presente em diversos recantos de
minha terra, especialmente no alvorecer, um momento sempre belo, e realizar seu
registro.
A
minha força, sem dúvida, chegou-me através da liberdade em estar utilizando o
meu paradigma do horizonte em transversal. Sem ele, as imagens obtidas continuariam
maravilhosas, mas estariam estáticas, solenes. Estas duas características não
me representam nem um pouco, prefiro todo este dinamismo, sensação de
movimento, instabilidade que o enquadramento em diagonal nos confere.
Bresson
(2004) nos conta que a câmera fotográfica não é um instrumento apto para
responder o porquê das coisas, ela é antes feita para evocá-lo, e noutras
vezes, ela pergunta e responde ao mesmo tempo. Deste modo, minhas imagens são
questões, inicialmente aos meus alunos e agora a quem quer que seja: E se o
mundo fosse inclinado? Você é capaz de perceber o que se encontra ao seu redor,
em seu cotidiano? Eu desconstruí locais para que eles os percebessem
atentamente e os reconstruíssem (ou não). Foi um recurso didático e lúdico
utilizado para atrair o olhar dos alunos para seu próprio lugar, tantas vezes menosprezado.
Gosto de brincar com a possibilidade de te molhar com o rio ou o mar, quando ele
está inclinado. A vertigem de ver minha terra tão querida inclinada. Quero e
preciso de Arte para me libertar e imprimir todas minhas fantasias,
excentricidades. Bresson (2004, p.12) me assegura que isto é possível, já que
fotografar: “É uma maneira de gritar, libertar-se, não de provar nem afirmar
sua própria originalidade. É uma maneira de viver”. Tencionei retratar minha
cidade de modo que me representasse.
As
fotos de paisagens são, na verdade, “paisagens interiores”. Os ideais são
antiéticos. Na medida em que a fotografia é (ou deveria ser) sobre o mundo, o
fotógrafo conta pouco, mas na medida e que é o instrumento de uma subjetividade
questionadora e intrépida, o fotógrafo é tudo. (SONTAG, 2006, p.138)
Eu ousei permanecer com este olhar, pelos meus
alunos, desejei ver minha cidade de um modo imaginativo, poético, único, para
que eles também a vissem assim e desejassem apreciar cada vez mais nossa terra.
Acredito
e não sou a única a crer que o professor de artes precisa manter sempre uma
poética visual, também Favero (2008, p. 09), fala que “ao afastar-se da prática
artística, o artista – professor inibe o movimento criativo gerador de todo o
processo pertinente ao ensino de arte”. Deste modo procurei como arte educadora
desenvolver uma poética visual, para que esta pesquisa sobre Itanhaém não
estivesse apenas a cargo dos alunos, mas também de mim. Eu desejei preparar um
material de leitura estimulante aos meus alunos.
Ao
questionar-me: como devem ser imagens para as crianças? Pude encontrar as
respostas com Lewis (2009), que mesmo não enfocando imagens, mas sim textos
escritos para crianças, aborda a questão com sabedoria. Clive Staples Lewis
(1898-1963) foi o grande criador de “As Crônicas de Nárnia”, em que num artigo
posterior à série de livros, fala que para se escrever para crianças não há
fórmulas mirabolantes, basta escrever o que você gostaria de ler.
Como minha série fotográfica é uma narrativa
visual, baseei-me nesta declaração do autor para trabalhar: fotografei o que eu
gostaria de ver sobre minha cidade, após uma aula, quando discutíamos acerca
das imagens nos folhetos turísticos. Desejei vê-la de um modo único, especial,
fantasioso, que mantivesse minha personalidade, desejei uma série fotográfica
em que me revelasse.
Aliás,
tudo na história deve brotar da estrutura de caráter do autor. Para escrever
para crianças, temos de partir dos elementos disponíveis de nossa imaginação
que temos em comum com elas. Somos diferentes de nossos pequenos leitores não
por nos interessarmos menos, ou menos seriamente, pelas coisas de que estamos
tratando, mas por termos outros interesses de que as crianças não compartilham.
A matéria de nossa história deve fazer parte do mobiliário de nossa mente. Foi
essa, a meu ver, uma característica de todos os grandes escritores de
literatura infantil, mas nem todos o compreendem. (LEWEIS, 2009, p. 750)
Muitos
se sentiriam constrangidos a admitir que sua criação seja pautada em sua
infância, mas eu não. Aprendi com Lewis (2009) a não ter medo da crítica
recheada de desprezo, quando, como é no caso dele, escrever livros de fantasia.
A crítica utiliza o termo “adulto” como sinal de aprovação. Identifico-me com o
autor, pois busquei o lado lúdico e fantasioso do enquadramento em diagonal.
Realmente deixei meu lado “criança” aflorar muito mais no processo criativo do
que meu lado “adulto”, racional. Porém, nas palavras de Lewis (2009, p. 173)
“os críticos para quem a palavra “adulto”
é um termo de aplauso, e não um simples adjetivo descritivo, não são nem podem
ser adultos,” pois, preocupar-se em ser adulto ou não, envergonhar-se de que se
é infantil são características da infância e da adolescência. Quando
persistentes até a idade adulta, é algo bem preocupante.
Não há nada de errado em não perder um gosto
que tínhamos quando éramos criança. Não é um motivo de vergonha. Vergonhoso é,
de acordo com o autor, não aceitar as coisas novas. Nós não devemos levar nossa
vida nunca negando o passado, deixando vivências preciosas para trás, mas sim
acrescentando, a cada dia, nunca substituindo, mas sim crescendo. Este é o real
sentido da palavra. Criei, portanto esta série fotográfica encarando meus
leitores alvo (os alunos das quintas séries A e B do ano de 2011) como iguais a
mim. De uma itanhaense para outros itanhaenses.
Uma
das particularidades que percebi durante a escrita dos significados de cada
foto a mim, foi que tudo foi norteado pelas lembranças de minha infância, de
quando minha avó nos levava para passear em diversos lugares daqui. O que
Martins (2008) fala sobre a polissemia de significados para cada um, obviamente
para o fotógrafo o significado também muda de acordo com o contexto em que está
inserido, de acordo o seu momento de vida. Tenho certeza de que se minha avó
ainda estivesse viva, estas séries seriam completamente diferentes, pois eu não
teria tanta sede por visitar estes lugares significativos de minha infância. A
dor do luto ainda é recente.
Ao
observarmos uma fotografia, devemos estar conscientes de que a nossa
compreensão do real será forçosamente influenciada por uma ou várias
interpretações anteriores. Por mais isenta que seja à interpretação dos
conteúdos fotográficos, o passado será visto sempre conforme a interpretação
primeira do fotógrafo que optou por um determinado aspecto, o qual foi objeto
de manipulação desde o momento da tomada de registro e ao longo de todo
processamento, até a obtenção da imagem final. (KOSSOY, 2001, p.113)
Todos
nós temos um porto seguro depois de um longo dia de trabalho. O meu era
observar as cadeias de montanhas que compõem a Serra do Mar ao longe, azuladas,
distante de nossa cidade. Uma rápida observação do alto da rodovia Padre Manoel
da Nobrega, pela ciclovia, quando esta alcançava pontos altos, como os viadutos
dos bairros Jardim das Laranjeiras e Cidade Anchieta e quando atravessava o Rio
Itanhaém. Às quatro horas da tarde, o sol confere-lhes um brilho prateado muito
especial. Quando o céu está limpo, sem nuvens, os raios solares incididos sobre
elas, revelam-nos detalhes tão maravilhosos que em dias nublados em não via. As
texturas das montanhas, cada uma daquelas árvores compondo uma imensa cadeia de
montanhas. Gostava de sentir seus tons azuis, devido à atmosfera. Era sempre um
prazer observar as sutilezas das mudanças de tons a cada conjunto de montanha,
percebendo, portanto a distância de cada uma até a mim. As mais claras aquelas
tingidas de um azul anil tão diluído me fazia sonhar... O que estaria
acontecendo naquele lugar?
Assim
como o colecionador, o fotógrafo é animado por uma paixão que, mesmo quando
aparenta ser paixão pelo presente, está ligado ao passado. [...] É acima de
tudo, uma afirmação da existência do tema. Sua honestidade (a honestidade de
olhar cara a cara, da ordenação de um grupo de objetos), que equivale ao padrão
de autenticidade do colecionador; sua qüididade – quaisquer virtudes que o
tornem único. O olhar do fotógrafo profissional, sôfrego e superiormente
obstinado, é um olhar que não só resiste á classificação e à avaliação
tradicionais dos temas, como busca, de forma consciente, desafiá-las e
subverte-las. Por esta razão, sua abordagem do assunto em foco é bem menos
aleatória do que em geral se alega. (SONTAG, 2006, p. 93)
Meu
olhar também se dirigia ao céu, observar seus desenhos, suas texturas,
principalmente às nuvens próximas ao sol, durante o entardecer. As que mais me
encantam são as nuvens estriadas, cirros rosados esguios mostram-se depois de
temporadas chuvosas, minutos, apenas minutos deste espetáculo multicolorido.
Apenas instantes... E logo se voltam a acinzentar-se, logo o sol está posto e a
noite vem mais uma vez. Tudo é sempre
rápido. Poucos percebem este espetáculo.
O
fotógrafo é, por excelência, o artista mais rápido que existe. Essa rapidez de
execução da obra de arte acrescenta uma responsabilidade enorme ao fotógrafo:
captar o “momento certo”, o enquadramento perfeito, a expressão ideal. É, sem
hesitações, este o maior anseio do fotógrafo-artista. A obra de arte “instantânea”,
no sentido fotográfico do termo, concede a qualquer observador, a qualquer
amante de arte, o grato prazer de apreciar e contemplar as diferentes
“paisagens”, tal como, da mesma forma, a pintura o permite.
O
fotógrafo ao “clicar” ou ao “recrear” as composições, recorrendo, neste caso
último, às novas tecnologias de digitalização ou multimídia, convida o
contemplador à colocação de diversas questões. À semelhança do pintor, convida
o observador a refletir, a interpretar, da forma que entender a obra de arte.
(TAVARES, 2009, p.7)
De
acordo com o pensamento de Bresson (2004), em tudo o que olhamos no mundo, até
mesmo em nosso universo pessoal, lá está um tema. Basta sermos lúcidos para
tudo o que está passando e honestos face ao que sentimos face ao que estamos
vendo. Nas palavras do grande fotógrafo: “Em fotografia, a menor das coisas
pode ser um grande tema.” (BRESSON, 2004, p.20) Deste modo, a cada saída de
casa, nos mais insignificantes caminhos, eu estava atenta a qualquer momento
para obter uma boa imagem.
O
fotógrafo apenas mostra os ponteiros do relógio, mas ele escolhe o instante, um
lance, uma resposta, de erguer o aparelho à linha da mira do olho, prender na
pequena caixa econômica o eu surpreendeu, capturar em pleno voo sem trapaças,
sem deixar escapar. Faz-se pintura ao tirar-se uma foto. (BRESSON, 2004, p.41)
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